A sexualização das personagens femininas: e você com isso?

por Helô D’Angelo

Mulher Maravilha, Viúva Negra, ‘escrava’ Leia, Lara Croft, Mulher Gato, As Panteras, Lolita, Pocahontas, Megara (de Hércules) Arlequina, Poison Ivy, Mary Jane, Chun-Li (de Street Fighter), Mikaela Banes (de Transformers), as Bond Girls, Jessica Rabbit, Mística, Alice (de Resident Evil), Sininho, Lola Bunny, a cigana Esmeralda, Tina (da Turma da Mônica), Kate (de Lost). O que todas essas personagens têm em comum?

a) São mulheres;
b) São sexualizadas.

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“Deixa eu lutar contra os vilões aqui com o meu… maiô tomara que caia… e minha bota de salto-alto…”

Não precisa mergulhar muito fundo no mundo da ficção para encontrar personagens como essas. Elas são mulheres fisicamente maravilhosas, que geralmente usam roupas super desconfortáveis, como saias, maiôs e salto alto, mesmo que elas precisem lutar ou sobreviver ao fim do mundo. O cabelo é sempre impecável, a maquiagem está sempre no lugar (mesmo quando elas acordam de ressaca ou têm três filhos para criar), e elas sempre têm algum talento – mas, por mais incrível que sejam, elas jamais se igualam aos personagens homens.

Essas mulheres compõem a maioria das personagens femininas no mundo da ficção. Estão nas telonas, na TV, nos clipes de música, nas páginas dos livros e das HQs por uma razão: elas são o espelho do que nós, mulheres, deveríamos ser, dentro de uma lógica machista.

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“Descobrindo tumbas e sendo sexy”

Acha que eu estou exagerando, não é? Vamos aos números. De acordo com o Instituto Geena Davis de Gênero e Mídia, nos filmes com a classificação indicativa ‘livre’, as mulheres aparecem três vezes menos que os homens. Quando aparecem, porém, elas têm quatro vezes mais chances de ser distorcidas de uma forma sexy (leia-se: roupas curtas e decotadas, maquiagem, corpos com cintura fina e peitos grandes).

De 2006 a 2009, nenhuma (eu disse nenhuma) das personagens nesses filmes estava nos campos da medicina, da ciência, da lei ou da política – os números mostram, ainda, que nesses filmes 80,5% dos trabalhadores eram homens – sendo que, na vida real, as mulheres representam 50% da força trabalhadora.

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Estava achando que a Tina era exagero, né? Então.

Se ainda acha que é exagero, tente fazer uma lista rápida de 20 mulheres importantes e não-sexualizadas nas obras de ficção mais populares. Aposto que você vai parar na Hermione (que, aliás, foi criada por uma mulher). E aposto que a lista dos homens sai em cinco minutos.

É frustrante. Mesmo quando as mulheres são representadas de uma forma minimamente humana, alguém encontra um jeito de colocar a personagem em um traje mais sexy – como aconteceu com a princesa Leia, de Star Wars. Ela passa toda a primeira trilogia com roupas confortáveis de batalha, mas bastam 15 minutos em um dos filmes vestida como escrava para que todos os brinquedos e posteres da princesa mostrassem-na com essa roupa (?):

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E é a mesma pose da Angelina, gente. rs

Eu jamais me vi representada pela Mulher Maravilha, aliás. O máximo que eu sentia era um incômodo por saber que eu jamais seria como ela, sarada e maravilhosa. Todas essas mulheres surreais das minhas obras de ficção favoritas me ensinaram que não importa quão bem você atire, crie fórmulas matemáticas, lute contra bandidos ou salve o mundo de zumbis: é sempre o seu corpo que importa, acima de tudo – menos dos homens.

Essas mulheres poderiam facilmente ser capa de alguma revista de moda. Não é à toa: elas reforçam o padrão de beleza que nos faz acreditar que nós somos feias demais, gordas demais, inadequadas demais – afinal, se nossas heroínas são assim, nós deveríamos ser também. Tudo uma grande besteira.

Mas há até bem pouco tempo, essa era a regra. Como não podíamos nos espelhar em ninguém além dessas minas “perfeitas”, nos sentíamos umas bostas. Por isso é tão importante que existam personagens como a Furiosa, de Mad Max, ou as mulheres de Orange is the New Black. Ou a Rey, do episódio VII de Star Wars, ou a Jessica Jones.

Elas são mulheres humanas, com falhas, traumas, características próprias, talentos incríveis, e que podem superar homens. E elas nos permitem perceber que o nosso aspecto físico não é a coisa mais importante na gente – e que não precisamos seguir padrões inalcançáveis para nos sentirmos bonitas. Representatividade é tudo, meninas. 

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Diversidade, força, humanidade, falhas e roupas que cobrem a bunda ❤

* Para saber mais sobre os estudos de gênero em obras de ficção, clique aqui (em inglês, infelizmente, mas me coloco à disposição para qualquer ajuda!)

Helô D'Angelo
Helô D’Angelo tem 21 anos e sempre se perguntou como alguém conseguia lutar usando salto agulha.

11 comentários

  1. Provavelmente você vai duvidar do que eu irei lhe dizer, mas eu vou contar mesmo assim. À alguns minutos atrás na parte do texto que você pedia para fazer a lista das 20 mulheres não sexualizadas eu abri um bloco de notas e fui escrevendo os nomes que me vinham em mente. Só para constar regularmente eu leio e assisto uma quantidade considerável de obras dos mais variados tipos. Cogitei personagens de mangás, gibis, livros, novelas, series, jogos virtuais, doramas, filmes (etc). Em poucos minutos a minha lista já tinha passado de 100. Observação: E ainda me vinham em mentes mais nomes, porem achei redundante continuar listando. Fechei o bloco de notas sem salvar e continuei a ler o seu texto. Ao ler “aposto que você vai parar na Hermione” com todo respeito me desculpa, eu não aguentei e comecei a rir. Eu contrariei as expectativas.

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    • Você poderia me mandar a sua lista? Pq você provavelmente não percebeu muitos casos por não ser com o seu corpo

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  2. Verdade… Por que só as nossas formas e a nossa beleza é algo notável e preferível principalmente nas mídias? – Na minha faculdade há mulheres inteligentíssimas, mais decididas e focadas que muitos homens e a única coisas que todos lá reparam nesses mulheres são suas formas femininas e a sua beleza, ninguém as elogia pela sua inteligência ou talento. – Se a mulher não for vista como uma ” gostosona” nenhum homem quer saber desta. – Infelizmente há esteriótipos, mulher tem que ser bonita, ter um corpo agradável para eles e ainda ser boa de cama e fazer coisas que temos vergonha e não gostamos só para agradá-los. O que ganhamos com isso? Homem valorizando apenas curvas e beleza, somente. E quando essa beleza acaba? Somos chutadas? Trocadas ? Traídas? . – Quem acha que o homem ao envelhecer logo se torna sábio sobre certos passo, muito por aí se engana.- Pois já vi muitos velhos nojentos babando mulheres novinhas e lindas por aí. A verdade é que o homem é uma bosta e infelizmente não fomos nos mulheres que dominamos os homens e fizemos deles nossos escravos. Eu queria ter nascido homem, ou talvez não. Eles são os piores tipos de pessoas, 80% dos crimes passionais são causados por eles; eles se aproveitam de garotas inocentes, gostam de por regras sobre nos e em nossos corpo… E há mulher que o segue sendo uma vadiazinha… Eles não tem sentimentos, mulheres pra eles só interessa o sexo e a beleza dela, um corpo sensual e um rosto de deusa.

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  3. Entendo as queixas apresentadas aqui. Já li varias parecidas em outros lugares.

    Mas, acho que lhe escapa a atenção de que tais as historias de heróis tem público-alvo claro – homens jovens. Isso é feito para eles, em primeiro lugar. Podemos reclamar que e apelativo (sexo pra vender), mas funciona.

    A prova disso é que, nos desenhos animados voltados pra crianças, essa sexualizacao some.

    Apesar de muitas lerem, as mulheres não são um consumidor costumeiro de quadrinhos. Se fossem, teríamos historias como os Shoujo japoneses, onde são os homens os objetificados.

    E tudo uma questão de publico, só isso. Fora o fato de ser FANTASIA, por isso os exageros.

    Um abraço!

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